


Carolina Lyan Branco, arquiteta e urbanista, fala sobre habitação social
Equipe JMP
edição especial
O Programa Habitação de Interesse Socialé um projeto com objetivo de oportunizar o acesso à moradia para a população de menor renda.Esse programa passa pelautilização de políticas governamentais distintas, de proteção ao pobre, investindo em infraestrutura, assegurando que o acesso à habitação deve invariavelmente vir acompanhado dos serviços básicos de mobilidade, saneamento e econômicos.
O desabamento do prédio Wilton Paes de Almeida, no centro de São Paulo,no feriado de 1º de maio, mostrou o drama habitacional na capital paulista. O caso abriu discussões sobre o incêndio, a condição em que as famílias viviam naquele e em outros imóveis abandonados na capital e, principalmente,sobre direito à moradia.
Para aprofundar esse interesse sobre habitação social, o Jornal Matéria Prima entrevistou a arquiteta e urbanistaCarolina Lynn Branco Ribeiro, formada pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), 27, e que trabalha no escritório Morar – Arquitetura e Urbanismo e no Grupo de Estudos de Assistência Técnica para Habitação de Interesse Social(Geathis).
SaskiaSassen é uma socióloga holandesa conhecida por suas análises nos fenômenos de globalização e de migração urbana. Nos textos dela é sempre relatado um tripé essencial para o desenvolvimento urbano na atualidade: sociedade, economia e meio ambiente. Como esse tripé é visto no resultado de uma ação que é a habitação social?
A resposta tangencia o conceito de sustentabilidade, que antes se referia a questões ambientais, mas hoje extrapola para os campos econômico, social e político, de forma que podemos aplicar o conceito de Ignacy Sachs[ diga aqui quem é], que defende que para se atingir uma relação de equilíbrio devemos buscar relações mais harmônicas tanto nas nossas relações com o meio no qual estamos inseridos quanto nas interações entre as pessoas. Segundo Mülfarth[diga aqui quem é] a miséria e as diferenças sociais são obstáculos quando se busca uma consciência ecológica e mudanças no comportamento da população. O arquiteto Eduardo Tranicompartilha dessa opinião, sugerindo que enquanto houver ocupações informais [ou cidades informais] não será possível alcançar o patamar do real desenvolvimento. Ou seja, o ideal é que as habitações populares atendam todas as dimensões da sustentabilidade, fato nem sempre concretizado como você poderá comprovar em muitas outras pesquisas.
Com o incêndio ocorrido no edifício Wilton Paes de Almeida, localizado no centro de São Paulo, o debate sobre o uso de prédios públicosabandonados como fonte viável de habitação popular entra mais uma vez em pauta na mídia. Como arquiteta, o que você pensa sobre o assunto?
Bem, a ocupação de edifícios ociosos no centro das cidades deveria ser uma alternativa mais considerada pelos gestores públicos uma vez que essas áreas já possuem infraestrutura instalada e acesso aos serviços e equipamentos públicos. Infelizmente temos poucos exemplos de obras assim, dentre eles posso citar o edifício Dandara, também no centro de São Paulo, entregue no ano passado se não me engano. Foi um retrofit[processo de modernização]feito através do Minha Casa,Minha Vida – Entidades. O desabamento daquele prédio só demonstra o descaso do poder público em fazer cumprir a função social do lote. E aproveitando o espaço, é vergonhoso criminalizar ocupações urbanas legítimas.“Enquanto morar for um privilégio, ocupar é um direito” [paráfrase atribuída aos movimentos sociais].
É vergonhoso criminalizar ocupações urbanas legítimas
Há pouco mais de um ano, no dia 4 de abril de 2017, pela primeira vez na história de Maringá ,um projeto do escritório no qual você trabalha, fez com que a prefeitura, por meio do programa federal Minha Casa Minha Vida – Entidades,firmasse parcerias para construção de habitações de interesse social. Que benefícios o projeto traz para a cidade?
Essa pergunta é um pouco complexa porque tem alguns nuances. Construir HIS [ Habitação de Interesse Social] é bastante comum nas prefeituras através de licitações. Você poderá levantar facilmente junto ao Lorin o número de contratações dessa gestão. O problema é a forma como essas construções se dão, e aí volto na resposta da primeira pergunta quando digo que você achará facilmente diversas pesquisas abordando as questões construtivas desse tipo de habitação. O que aconteceu há um ano foi uma abertura da prefeitura em firmar parceria com uma Organização da Sociedade Civil, a União por Moradia Popular do Paraná, filiada a União Nacional de Luta por Moradia. Naquele caso respondemos a um edital do programa nacional Minha Casa Minha Vida, modalidade Entidades. Infelizmente nosso país não vive sua melhor fase e essa modalidade está sofrendo diversos desmontes, e mesmo após um ano de atraso não liberou a lista completa das propostas selecionadas. Quero dizer com isso que a parceria não foi efetivada até hoje uma vez que a construção não foi contratada pelo Ministério das Cidades. De qualquer forma, ainda acho que a prefeitura local deveria ser menos tímida em buscar essas parcerias visto o sucesso de outros empreendimentos de mesma natureza por todo o território nacional.Projetos autogestionários como esses, além de fazer cumprir o direito constitucional à moradia digna, também estimulam o envolvimento conjunto e político das famílias envolvidas. Caso você tenha interesse, sugiro que assista ao documentário produzido pela assessoria técnica Peabiru TCA sobre o tema, chamado “É o que eu vejo, é o que eu penso”.
Em diversos artigos sobre habitação social e, inclusive, na página do escritório no qual você trabalha [MORAR – Arquitetura e Urbanismo], fala-se bastante em garantir o “direito à cidade” aos habitantes de moradias sociais. O que significa esse “direito à cidade”?
É a garantia regulamentada pelo Estatuto dasCidades, que todo brasileiro tem de usufruir da estrutura e dos espaços públicos de sua cidade, com igualdade de utilização.
A luta para conquistar um lugar para se morar, na maioria esmagadora, sempre vem acompanhado de bandeiras e bonés. Qual a importância dos movimentos sociais na luta pela construção de habitações sociais?
É de total importância. Os movimentos de luta por moradia são compostos por pessoas que vão morar nessas habitações e a organização das mesmas é a única forma delas serem ouvidas, vistas e respeitadas, e ainda assim com bastante dificuldade. Por isso que os movimentos sociais têm cadeiras em todos os conselhos de gestão dentro dos poderes públicos, seja no Conselho do FMHIS[Legislação Fundo Municipal de Habitação de Interesse Social] aqui em Maringá ou no Conselho Nacional das Cidades, dentro do Ministério das Cidades.
Jornal Matéria Prima é produzido por alunos do curso de Jornalismo do Centro Universitário Cesumar - UniCesumar - na disciplina Técnica de Reportagem.