


A única escolha agora é ser forte, acostumar-se com o caos e a morte
Allan Cavalcanti
Estudante de Jornalismo
Mais um dia começa. Não um daqueles bonitos que não vemos aqui, e sim um dia que se repete há muito tempo. O silêncio que, sorrateiramente, tenta trazer calma não tem espaço ante a visão de corpos no chão, visão essa que desperta o sentimento de desespero. Ninguém desejaria acordar assim. Não existe outra escolha a não ser, ser forte.
Um homem sai desesperadamente de casa com uma criança no colo. Ambos tapam os rostos, o cheiro de morte é insuportável. O garoto leva nos braços um pequeno livro, provavelmente um diário, a última lembrança que terá daquele lugar.
Distantes da guerra, agora em um barco onde muitos tentam se consolar, o garoto escreve no diário.
“Querido diário, hoje dia 1º de setembro de 2015, papai e eu saímos de casa, foi o pior dia da minha vida. Mamãe não veio com a gente, aqueles idiotas destruíram tudo. Papai disse que estamos indo para a Grécia, mas eu só quero buscar a minha mãe. Não aguento mais.”
(Imagem/Reprodução)
O mar calmo que acalenta, que traz paz, também abre brechas para lembranças que trazem dor. Depois de tantas noites inquietantes e orações sem sucesso, o pai do menino, que o tem nos braços, olha para o céu e pede baixinho para Deus que tudo dê certo a partir de agora, “Senhor, cuide do meu filho, estão sendo dias difíceis, mas sei que o Senhor está nos levando a um paraíso”. Logo após a última oração, todos dormiram ao som inquietante do silêncio.
Ao amanhecer, o mar parecia mais calmo. Todos os relatos de alguém que nunca pediu para estar nessa guerra e muito menos entendia o porquê de estar passando por tudo aquilo, foram encontrados. Um pouco distante do corpo, à beira da praia.
Ninguém desejaria acordar assim. Não existe outra escolha a não ser, ser forte
Talvez nunca haja a paz definitiva. Talvez ainda não entendamos como respeitar o próximo e viver bem uns com os outros. Talvez a guerra esteja dentro de cada um de nós. Talvez o paraíso não seja em outro país, e sim para onde são enviados os pedidos de ajuda em forma de orações.
Jornal Matéria Prima é produzido por alunos do curso de Jornalismo do Centro Universitário Cesumar - UniCesumar - na disciplina Técnica de Reportagem.