


Por alguns minutos, quis acreditar que dessa vez ia ser diferente
Láiza Maciel
Estudante de Jornalismo
Depois de muitos anos trabalhando na mesma empresa, recebi uma proposta impossível de ser recusada. Eu estava havia 15 anos vivendo uma rotina cansativa, não tinha prazer nas matérias que produzia. O meu antigo chefe sempre dizia, “lembre-se: notícias ruins na primeira página, esqueça essas bobagens sobre a vida.”
Sou um escritor e tanto, cobiçado por muitos jornais e editoras. Minha grande paixão é escrever sobre a vida, sobre as idas e vindas, desencontros e reencontros, amores não correspondidos, alegrias, tristezas e emoções. Os meus textos são motivadores, gosto de ver as pessoas repousando sobre cada palavra ali escrita, se identificando e se colocando nas minhas histórias.
É preciso informar, só que, mais do que isso, é preciso dar esperança ao povo brasileiro
Por ironia do destino, isso não dava dinheiro para o meu chefe.Tinha que escrever sobre coisas ruins, narrar acidentes, falar sobre jovens que perderam a vida, conversar com assassinos, noticiar que mais uma vez a verba da merenda escolar foi desviada, que os hospitais estão sem remédios, teve mais um ataque terrorista, e depois de tudo isso ainda defender os políticos. Enfim, estava cansado de tanta hipocrisia, cansado dessa mesmice.
Sou mais um jornalista no meio da multidão, levando para os leitores a triste notícia que o desemprego não diminui (eu via o desespero no olhar de cada pai desempregado durante as entrevistas). No outro dia mais notícias ruins, os nossos representantes madrugaram na Câmara e aprovaram uma lei que os beneficia. Quando não é isso, tem a reforma trabalhista, tiroteio na Rocinha, grávida baleada na barriga, crianças queimadas numa creche em Minas.
Será que só eu que estou ficando louco, que só eu acho excessivo ter milhares de jornais escrevendo e narrando notícias ruins todos os dias? É preciso informar, só que, mais do que isso, é preciso dar esperança ao povo brasileiro. Não estou sugerindo “tapar o sol com a peneira”, só quero meia página do jornal para publicar textos que as pessoas possam desfrutar e acreditar.
Hoje é o meu primeiro dia no meu novo emprego. Meu chefe me prometeu aquela página no jornal. Estava crente que dessa vez iria ser diferente e, finalmente, iria poder me dedicar aos assuntos que realmente gosto. Porém, quando sentei à minha nova mesa, havia um bloco de notas amarelo, sinalizado com caneta de cor vermelha.
- Preciso que você escreva sobre a reforma política, naquela meia página que havia lhe prometido.
Jornal Matéria Prima é produzido por alunos do curso de Jornalismo do Centro Universitário Cesumar - UniCesumar - na disciplina Técnica de Reportagem.