


Procurava pensar que tudo poderia melhorar e talvez a felicidade voltasse
Bruna Araujo
Estudante de Jornalismo
(Imagem/Arquivo pessoal/ Bruna Araújo)
Ela sempre foi estranha. Reclamava sempre de ser incompreendida, sempre ignorava qualquer um que se aproximava. Ao trocar o primeiro beijo com alguém, já pensava na desculpa que daria para não vê-lo mais. Sentava-se na sacada de casa e enquanto o sol batia nas suas pernas fumava um cigarro escondido, observando o balanço das árvores e cantos dos passarinhos. O sorriso debochado e sarcástico de sempre tomava lugar no rosto dela, não importando o tanto que os olhos verdes grandes, os cabelos negros e longos fossem sedutores e maravilhosos.
Não foram vocês mamãe, sou eu a quebrada. Sempre fui. Não sei como me consertar
Todos sabiam que ela era solitária e errada. Ela mesma estava ciente disso, mais que todos até. “Onde erramos?”, ouvia a mãe dizer para o pai e o irmão. Os sussurros desesperados e os soluços quase inaudíveis, somente o marido e o irmão conseguiam ouvir, mas a filha sabia que o choro acontecia, pois ela conhecia muito bem a progenitora.
- Não foram vocês, mamãe, sou eu a quebrada. Sempre fui. Não sei como me consertar, por favor me ajudem. Eu amo vocês. Quero ficar bem. E quero lhes deixar bem. Por favor me perdoem por tudo que lhes causei nesses 18 anos. Eu juro que irei compensá-los. Nada é culpa de vocês. Amo vocês demais.
Era isso o que ela queria dizer, era isso o que a mãe precisava ouvir. Era essa a verdade. Em vez disso, ela se trancou no seu quarto e se pôs a chorar.
- Quando foi que tudo isso começou a acontecer?
– Por que eu me tornei assim?
– Por que eu quero continuar assim? Eu quero? Não eu não quero!
Mais milhares de perguntas vagavam pela sua cabeça, todas julgando a si mesma. Afinal, já que todos o faziam, por que ela não podia?
Odiava o fato de que o começo de tudo teria sido a possível separação dos pais e o crescimento precoce dela. Odiava ser previsível. Odiava estar lotada de responsabilidades ainda tão nova. Odiava ter que lidar com os problemas dos pais. E para piorar, odiava ter que lidar com a depressão da mãe. Mas era quem era e apesar de disfarçar toda a delicadeza e esconder os medos com máscaras por que negar? Já tinha se machucado de qualquer jeito e aprendeu mesmo a suportar as dores e se manter de pé.
Era uma garota doce, apesar de tudo o que estava passando. Sempre procurava pensar que tudo poderia melhorar e talvez a felicidade voltasse a ela como o sol vem depois de uma tempestade. Mas, infelizmente, lamentou o fato de as coisas ainda não terem acontecido assim. Vive uma tempestade ainda maior após a tentativa de suicídio da mãe e os intermináveis dias de sofrimento, porém é lindo ver nos sonhos dela que essa tempestade vai passar.
Desejo calmaria e felicidade a essa menina. Tanta coisa e ainda se manter de pé com um sorriso? Também quero aprender a ser assim ou quem sabe aguentar um pouco de tudo isso?
O sol sempre volta a brilhar pela manhã e as coisas se organizam para o bem. As flores nascem, as cortinas se abrem e a felicidade bate na porta. Sorrir é importante e a vida ainda pode ser bela.
Jornal Matéria Prima é produzido por alunos do curso de Jornalismo do Centro Universitário Cesumar - UniCesumar - na disciplina Técnica de Reportagem.